
Em uma manhã de agosto de 2017, Samara de Jesus, então com 24 anos, despertou com uma sensação desconfortável que se estendia da cintura para baixo. “Era como se estivesse tendo cãibras ou formigamentos”, descreveu. Ignorando os sinais iniciais, atribuiu os sintomas à sua recente cirurgia de apendicite e seguiu para o trabalho. No entanto, em meio a uma crise de estresse, a situação se deteriorou rapidamente. “De repente, desabei no chão. Não conseguia me mover. Perdi a sensibilidade nas pernas por alguns segundos.”
O diagnóstico veio após um tempo: neuromielite óptica, uma condição rara que impacta o sistema nervoso central, notadamente o nervo óptico e a medula espinhal. Os sintomas característicos incluem fraqueza muscular, fadiga e dores, podendo resultar em sequelas devastadoras, como cegueira e incapacidade de locomoção. “Inicialmente, mencionaram a possibilidade de lúpus, esclerose múltipla e outras doenças autoimunes”, recordou Samara. Para complicar ainda mais a situação, ela descobriu sua gravidez enquanto lutava contra a doença.
“Fui forçada a me afastar do trabalho quando tive um surto durante a gravidez, após seis meses do diagnóstico. Passei quase 20 dias no hospital, perdi completamente a sensibilidade das pernas, além do controle da bexiga e do intestino. Fui submetida a uma sonda enquanto ainda estava grávida. A recuperação foi um desafio enorme; a inflamação na coluna demorou a ceder e a melhora foi gradual”, relatou. Foram necessários quatro surtos até que o tratamento adequado fosse iniciado. Hoje, Samara recuperou parcialmente a mobilidade das pernas, mas a fraqueza muscular persiste. “As sequelas permaneceram. Minha mobilidade não retornou completamente devido à fraqueza persistente. Desde o último surto, tenho que ser mais cautelosa ao caminhar. Minha perna se cansa rapidamente, começa a falhar. Embora eu não precise de auxílio para andar, a dificuldade é evidente.”
No Brasil, pelo menos três terapias foram aprovadas para tratar a neuromielite óptica: ravulizumabe, satralizumabe e inebilizumabe. No entanto, a inclusão desses medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS) depende da análise da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), o que pode representar um desafio adicional para os pacientes.
No Dia de Conscientização sobre a Neuromielite Óptica, o Congresso Nacional, em Brasília, será iluminado de verde até o próximo domingo (31), em uma tentativa de aumentar a conscientização sobre a doença.
O neurologista do Hospital Israelita Albert Einstein, Herval Ribeiro Soares Neto, em entrevista à Agência Brasil, explicou que essa doença, ainda pouco compreendida, afeta principalmente mulheres afrodescendentes e asiáticas entre 30 e 40 anos. “Na neuromielite óptica, o sistema imunológico ataca erroneamente as células saudáveis do sistema nervoso central, levando à inflamação e à desmielinização, um processo no qual a camada protetora dos nervos, chamada mielina, é danificada.”
Soares Neto enfatiza a importância de buscar ajuda médica imediata ao experimentar sintomas como perda de visão ou fraqueza súbita, pois um diagnóstico precoce e tratamento oportuno são fundamentais para evitar danos irreversíveis.
“O diagnóstico da neuromielite óptica pode ser desafiador, já que os sintomas se assemelham aos de outras doenças autoimunes e distúrbios do sistema nervoso central, como esclerose múltipla. Geralmente, envolve uma combinação de exames de sangue para detectar anticorpos específicos, ressonância magnética para visualizar lesões no nervo óptico e na medula espinhal, e, às vezes, uma punção lombar.”
“Embora não haja cura para a neuromielite óptica, existem tratamentos e cuidados que podem ajudar a controlar os sintomas e reduzir a frequência de surtos. Uma abordagem multidisciplinar, incluindo fisioterapia, pode melhorar a função e a mobilidade.”
O manejo da neuromielite óptica exige uma abordagem abrangente e acompanhamento contínuo por uma equipe de saúde especializada, incluindo neurologistas, oftalmologistas e fisioterapeutas, para adaptar os tratamentos às necessidades individuais do paciente e monitorar a progressão da doença.
Apesar de vários medicamentos serem considerados eficazes, ainda não existe um consenso sobre o esquema de tratamento ideal. A Conitec destaca que, embora diversas alternativas terapêuticas tenham sido aprovadas recentemente em todo o mundo, como rituximabe, tocilizumabe, eculizumabe e inebilizumabe, ainda não há diretrizes terapêuticas específicas ou amplamente aceitas.